POLÍTICA, MOVIMENTOS SOCIAIS E MEMÓRIA
A história política ganhou novo impulso com a rediscussão dos conceitos clássicos e das práticas políticas, e com a constatação de que o político não constitui um setor em si, mas se relaciona com todos os outros aspectos da vida coletiva. Esses estudos contribuíram para alargar a concepção da política para além da esfera institucional/administrativa e passaram a lançar luz sobre os múltiplos micropoderes atuantes na sociedade e sobre o papel de diferentes atores coletivos.
O político toma, portanto, o lugar da articulação do social e de sua representação, sendo igualmente a matriz simbólica na qual a experiência coletiva se enraíza e se reflete. Percebe-se, então, a política não como epifenômeno, mas sim como elemento explicativo do todo social.
Agentes políticos por excelência – e por isso mesmo objeto tradicional da reflexão historiográfica – os movimentos sociais englobam todas as intervenções coletivas destinadas a transformar as condições de existência de seus atores de exercer sua cidadania, de contestar as hierarquias ou as relações sociais gerando identidades coletivas e sentimentos de pertencimento baseados em valores comuns.
Partindo dessas definições, a linha analisará os movimentos sociais de forma ampliada, dando ênfase tanto àqueles mais estruturados, tais como os movimentos operário, estudantil e camponês, quanto às organizações de origem mais difusa, ligada a movimentos religiosos, imigratórios e militares, dentre outros. Movimentos, todos eles, que abrangem situações políticas, econômicas, sociais e de mentalidades.
Quanto à memória, parte-se da proposição inicial do já célebre texto: “O conceito de memória é crucial. ” (LE GOFF, 1990: 423). Crucial por sua importância e igualmente pelo seu caráter de cruzamento: cruzam-se, por exemplo, temporalidades, gerações, instituições e agentes sociais diversos. Cruzam-se também registro e invenção, real e imaginário, cotidiano e extraordinário, simbólico e concreto. Conjunções essas onde, em dinâmica complexa e tensa, são tecidas determinadas representações do passado – distante ou recente –, forjando-se novos relatos e significados. Tessitura sempre em contínua construção que, pelo fio da memória, produz igualmente seu oposto, o esquecimento. E aqui destaca-se a importância da história oral, sobretudo para os historiadores que trabalham com o tempo presente.
Pelo que se disse acima, tais processos de construção do passado a ser recordado – e também do silêncio ao qual são remetidas parcelas dos tempos pretéritos – são de especial interesse para o universo do político, tomado aqui em seu sentido mais amplo e já definido acima como o lugar de articulação da sociedade e de sua representação. Afinal, é no mundo da experiência que a memória cresce da história. E onde esta última alimenta a memória.
Os trabalhos da linha pretendem, portanto, privilegiar os processos de mobilização coletiva, em tempos democráticos e na vigência de regimes autoritários, analisando seus papéis em interação com outros movimentos, processos e o Estado, verificando os objetivos, a cultura política, as trajetórias que levaram à sublevação e suas consequências, numa relação dialética entre história e memória.
Em termos de marcos espaço-temporais, convém assinalar que nossos estudos e pesquisas irão contemplar os tempos modernos e contemporâneos em termos cronológicos, enquanto que do ponto de vista espacial nossa abrangência compreenderá os mundos americano, europeu e africano.